- Título: Karla e Emiliano
- Autor(es): Luis Estrela De Matos
- Instituição: Fundação CECIERJ
- Tipo: Educação Pública
- Data: 19/07/2011
- URL:
https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/11/28/karla-e-emiliano
- Código do Recurso: 20029
- Descrição: Pois é amiga, você foi embora e eu não tive a menor chance de dar uma última palavra pessoalmente (o telefonema da semana passada não vale!). Sei que o convite já era antigo para conhecer sua nova casa na Barrinha. Você e Emiliano se foram de um golpe só. E só a gente vai se sentindo nessa caminhada. Para onde se caminha enquanto se vive? Juro que não sei. Não sei nem se tem alguma coisa do outro lado. Não sei se nossa finitude é total. Se realmente nos exaurimos na morte. Eu só sei que quanto mais vivemos mais colecionamos perdas. Inevitavelmente. Uma espécie de preço por nos alongarmos por aqui. O camarada vai vivendo e vai juntando tanta coisa, tanta lembrança, tanto cemitério, tanta morte que a própria vida vai se tornando estranha e opaca. Fiquei opaco com a perda de Karla Hansen. Se pudesse me exprimir assim, eu diria que foi uma injustiça que o casal tenha sofrido isso. Uma futura mãe e um futuro pai não tiveram tempo de experimentar o novo momento que se desenhava. O desenho foi desfeito. Subitamente. Estupidamente. Acho que o que estou tentando dizer aqui é que a vida é muito estúpida, sim. A gente se vê obrigado a experimentar certas coisas sem aviso prévio. Tenho que experimentar, daqui pra frente, a perda definitiva de minha melhor amiga. Doçura, alegria, silêncio, sorriso, timidez, ética, respeito pelo outro, tudo isso, que era de Karla, diminui em mim. O bom amigo, esteja ele onde estiver, melhor ainda, o verdadeiro amigo, esteja ele onde estiver, é sempre uma força que pulsa dentro de nós. Perder alguém, e perder de maneira estúpida e absurda, torna as pulsações mais lentas. Ontem experimentei um verdadeiro luto dentro de mim. Eu e Clarissa, minha mulher. Ontem tive muita vontade de poder falar com suas irmãs, de rever Leonardo, Bruno. E de dar um abraço forte e profundo no amigo Telmo, o pai. Não sei o que poderia falar numa hora dessas. O desabafo deste texto tem sentido preciso. É que qualquer pessoa que tenha conhecido razoavelmente Karla não acredita que tudo isso... Vamos ficar por aqui. Não quero fazer literatura. Os místicos de última hora serão sempre melhores do que eu nesse departamento. As autoajudas estão todas aí, vendendo como o diabo gosta. Quero apenas registrar que Emiliano e Karla farão uma enorme falta. Tomara que Guimarães Rosa esteja certo. Encantaram-se.
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